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Jos van Riswick |
Mais
uma vez o sol nasceu como no era uma vez. E no era uma vez nasceu,
como o sol, Maria. Dentro dela havia todos os sonhos. O mundo parecia
estar ao alcance das suas mãos e longe dos seus pés. Vivia
entretida na sua própria casa, no entanto, era no pomar que seus
olhos brilhavam. Suas primeiras lembranças estavam lá enterradas
como uma pequena semente. Ela já não lembrava mais porque aquela
semente era tão especial. Procurava, em vão, fincar os pés no
presente. Talvez o interesse pelo pomar, já coberto por ervas
daninhas, fosse explicado pelo desejo de ver florescer a cor daquela
estranha semente. Ela era feita de esperança – a esperança de um
dia ver brotar o pé de alguma coisa. O pomar era cercado de pedras,
como uma fortaleza, que só deixava entrar a luz do sol. Até mesmo
os jornais lançados sobre o muro, ao longo dos anos, acumularam
próximos ao portão. Maria desistiu de apanhá-los logo nas
primeiras tentativas – impedida por suas frágeis rodas. As
notícias eram de um presente envolto em nuvens carregadas que jamais
choveram sobre os seus olhos. Maria, já esquecida da sua existência,
quase deixou o sol se apagar também. Certo dia, quando suas rodas
resolveram bravamente deslizar pelo pomar, depararam-se com algo
extraordinário.
A
pilha de jornais, outrora um empecilho, havia se transformado em uma
ponte, que finalmente a uniu ao lindo pé de alguma coisa. E lá
estava ela, a sementinha, agora transformada, irreconhecível. Maria
se perguntou como aquilo havia acontecido - seria um sonho? Se ao
menos tivesse dormido! A beleza do pé atraiu borboletas e pequenos
pássaros, que semearam inúmeras flores. Aqueles galhos viçosos e
as folhas verdes revelaram, bem lá no alto, um pequeno fruto. Maria
deixou os jornais de lado e se dedicou a observá-lo. Percebeu que
era tímido, já que amadurecia lentamente. Certo dia, ao nascer do
sol, descobriu que se tratava de uma linda ameixa. Foi aí que
desejou que suas rodas a levassem até lá – de forma que pudesse
senti-la com as próprias mãos. Maria se posicionou estrategicamente
debaixo da ameixeira e esperou - esperou que o pequeno fruto
amadurecesse completamente e caísse nas suas mãos sobre o colo:
– Essa
pequena ameixa vai se chamar esperança! – Pensou Maria.
Mas
a pequena ameixa demorou muito a revelar a sua verdadeira cor. Maria
ficou lá sentada, sozinha, esperando. E assim, mais uma vez, o sol
nasceu como no era uma vez e Maria, sobre as suas rodas, secou. O
tempo passou. Finalmente a ameixa amadureceu e caiu próximo das
rodas de Maria, e também secou, revelando no meio da casca protetora
uma semente - conhecida como Maria. E naquela hora nada mais
importava, pois as lembranças brotariam mais uma vez no lindo Pé de
Maria.
Comentários
muito bom.
beijo!
Um texto diferenciado, poético, muito bonito! (bem escrito)!
Ah, temos que apreciar as notícias fresquinhas que a ameixeira nos presentei antes dos jornais, ogadas em nossas mãos desde as sementes!
Um abraço, Marluce
Preciso te dizer algo: seu blogue é lindo, lindo, lindo!
Gostei muito.
Se quiser, dê uma olhadinha no meu (e siga-o, se for de seu interesse):
semcorponenhum.blogspot.com
Um grande abraço.
Até mais!
Narroterapia:
Uma terapia pra quem gosta de escrever. Assim é a narroterapia. São narrativas de fatos e sentimentos. Palavras sem nome, tímidas, nunca saíram de dentro, sempre morreram na garganta. Palavras com almas de puta que pelo menos enrubescem como as prostitutas de Doistoéviski, certamente um alívio para o pensamento, o mais arisco dos animais.
Espero que vc aceite meu convite e siga meu blog, será um prazer ver seu rosto ali.
http://narroterapia.blogspot.com/
http://letmego-monnie.blogspot.com/2011/07/primeiro-selinho-do-let-me-go.html
espero que goste ;)
viajei em suas palavras... Muita sensibilidade!
Metáfora de alguém que se rende
à contempl+ação?!
Abraço